30 anos sem Angenor de Oliveira, o Cartola

30 / 11 / 10

NULL

“Queixo-me às rosas/ Mas que bobagem/ As rosas não falam”. Se chorassem, há 30 anos elas chorariam por Angenor de Oliveira. No dia 30 de novembro de 1980, morria de câncer, aos 72 anos, Angenor de Oliveira, o Cartola.

A poesia e a melodia de Cartola seduziram não apenas Dona Zica, sua companheira mais famosa e com quem abriu o lendário Zicartola nos anos 60, mas também aqueles que ouviam e ouvem sua voz suave e músicas incomparáveis.

Entre os fãs e intérpretes mais famosos, a lista é imensa. Uma relação que vai desde sambistas de origem como Paulinho da Viola e Beth Carvalho, até músicos consagrados em outros gêneros, como Caetano Veloso, Cazuza, Ney Matogrosso, Zélia Duncan,e Marisa Monte e Cida Moreira.
Isso sem contar aqueles que, apesar de declararem aos quatro ventos sua admiração, não gravaram as composições de Cartola.

Nessa lista entram Chico Buarque, Vinícius de Moraes, Tom Jobim, Heitor Villa-Lobos, Sérgio Porto (o cronista Stanislaw Ponte Preta) e Carlos Drummond de Andrade.

Drummond, por exemplo, ao ouvir o samba “Sei Sentir” (“Eu fiz o ninho/ Te ensinei o bom caminho/ Mas quando a mulher não tem brio,/é malhar em ferro frio”)escreveu sobre Cartola: “Cartola sabe sentir com a suavidade dos que amam pela vocação de amar, e se renovam amando (…) O sol nascerá, com a garantia de Cartola.

E com o sol, a incessante primavera. A delicadeza visceral de Angenor de Oliveira (e não Agenor, como dizem os descuidados) é patente quer na composição, quer na execução.”

Mas a paixão e a admiração por Cartola não se resumem aos abençoados pelos talentos e pela fama artística.

Ela é universal, dos pedreiros e lavadores de carro, que exercem as mesmas profissões de Angenor de Oliveira, aos universitários, professores e profissionais liberais que adoram e ressuscitam o samba a cada balada até os que descobrem a poesia do mangueirense nesse exato momento ao som de “Acontece”, “Ensaboa Mulata” ou “Alvorada”.

Importância

Para o sambista maringaense Heligton Lopes, fundador do tradicional grupo maringaense Receita do Samba, a importância de Cartola é difícil de ser mensurada. “Cartola é importante desde a fundação das escolas de samba. Foi ele, com 17, 18 anos, quem teve a ideia de fundar umas das primeiras escolas de samba. Junto com o Carlos Cachaça, ele fundou a Estação Primeira de Mangueira, a segunda escola de samba do Rio de Janeiro”.

Lopes lembra que grandes nomes da música, como Heitor Villa-Lobos, que iam no morro beber da fonte do samba de bambas como Cartola. “Outra coisa interessante é a riqueza do que um pedreiro escrevia.

O Cartola era muito veloso. Ele treinava muito como violonista e para melhorar as letras de suas canções. Ele lia muita poesia, como Castro Alves, Gonçalves Dias, Olavo Bilac e o preferido, o Guerra Junqueiro.

Outra coisa importante foi o Zicartola, um bar que juntou os universitários com o povo do morro e de certa forma foi um dos responsáveis pela volta do samba nos anos 60”, diz.

Para Lopes, Cartola e sua música nunca será esquecido, principalmente por aqueles que gostam de música de qualidade. “É como disse o Nelson Sargento: ‘Cartola não viveu, ele foi um sonho’”.

Zicartola

O médico maringaense Robson J. Silva Souza pode ser considerado um privilegiado. Ele freqüentava o bar Zicartola no Rio de Janeiro todas as segundas-feiras na época em que morou na capital carioca no final dos anos 60.

O bar servia os famosos quitutes de Dona Zica e tinha no palco um grupo fixo formado por Cartola, Nelson Cavaquinho, Vera da Portela, Xangô da Mangueira e que recebia convidados frequentes, como Paulinho da Viola, Candeia e Elton Medeiros.

Souza lembra que era um local bem informal, em que você poderia até assistir aos shows em pé se quisesse.

O Zicartola ficava sempre cheio. A música de qualidade atraia grandes jornalistas, turistas e um público apaixonado pelo samba. “Era uma emoção muito grande. A casa representava uma resistência da música brasileira contra a invasão estrangeira. Ficava sempre um gosto de quero mais”.

Souza só tem uma tristeza: o fato de nunca ter conversado com Cartola.O grande sambista o cumprimentava, pois estava ali todas a semana, mas nunca conversaram. Mas o médico prestou sua homenagem há alguns anos, quando Cartola foi escolhido como tema de uma das edições do Plantão Musical em Maringá. “Cartola era um compositor brilhante, mas era alguém muito sofrido. Ele tem músicas muito bonitas e letras impressionantes”.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *